O sistema judicial brasileiro carrega um histórico marcado por operações de grande visibilidade, figuras de proa na magistratura e, infelizmente, recorrentes anulações devido a falhas processuais. Casos como Castelo de Areia, Satiagraha e Lava Jato ilustram essa tendência, onde atropelos às garantias legais invalidaram os processos, independentemente dos méritos das acusações.
Uma nova trama jurídica se desenrola agora, envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados. A semelhança com o caso do Mensalão é notável: ampla cobertura midiática, debates acalorados e votos minuciosamente transmitidos. No entanto, os primeiros atos dessa saga já despertam preocupações.
Um ponto de desconforto reside na própria tramitação do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). A recente mudança de entendimento da Corte sobre o foro por prerrogativa de função levanta questionamentos sobre a sua aplicação neste contexto específico, gerando debates acalorados no meio jurídico.
A decisão de julgar o caso em uma turma, e não no plenário, também causa estranheza. A Súmula 721 do STF estabelece que compete ao plenário julgar crimes atribuídos ao Presidente da República. A comparação com o caso de Lula na Lava Jato, julgado no plenário, é inevitável, levantando dúvidas sobre a legitimidade da decisão.
As defesas denunciam dificuldades no acesso às provas, alegando o recebimento de grande volume de documentos, dificultando a análise e organização da defesa. Essa desigualdade de acesso à informação pode comprometer o direito à ampla defesa, garantido pela Constituição Federal.
A disparidade de prazos entre acusação e defesa também é notável. O Ministério Público teve mais de 80 dias para analisar o relatório da Polícia Federal antes de apresentar a denúncia, enquanto as defesas tiveram prazos significativamente menores, o que pode prejudicar a paridade de armas no processo.
Por fim, a individualização das penas aos réus dos atos de 8 de janeiro é um desafio. A complexidade de distinguir as condutas de cada indivíduo não pode resultar em condenações genéricas. A coautoria exige um plano comum e contribuições concretas de cada agente, sob pena de injustiça.
O julgamento certamente entrará para a história, mas a história também nos ensina que processos espetaculares, com garantias atropeladas e desequilíbrio entre as partes, frequentemente culminam em nulidade. Resta saber se o presente caso seguirá esse mesmo caminho.
Fonte: http://revistaoeste.com